17 de julho de 2015

Orientação é terapia também

Em meu consultório, eu priorizo a orientação à familia, tanto quanto a realização da sessão de terapia propriamente dita.
Não há como desvincular a terapia da orientação. A orientação deve ser uma extensão do que é feito em sala com a criança, um meio de continuar o estímulo correto. Se a família se engaja no processo terapêutico e segue o que é proposto, a criança se torna muito mais estimulada e consegue generalizar o que foi aprendido para as situações cotidianas muito mais facilmente.
O objetivo de qualquer tratamento deve ser este: melhorar a vida da criança!
Por este motivo não consigo compreender como existem profissionais que não privilegiam a orientação aos pais e querem apenas realizar a sessão dentro do consultório e ponto final. Também não consigo entender como existem pais que delegam a função de estimular, apenas aos profissionais e não se abrem para ouvir o que deve ser feito em casa.
Entendo que a relação terapeuta-paciente e a dinâmica de muitas famílias interferem nesse engajamento e nesta troca contínua, mas a palavra de ordem é EQUIPE. Não só os profissionais mas a família também faz parte da equipe.
Convido a todos os familiares a procurarem realizar as orientações sugeridas. convido a trocarem informações com os profissionais dando-lhes mais informações do cotidiano da criança. A criança passa mais tempo com vocês. Os pais não precisam saber tudo de um determinado quadro clínico, mas devem saber tudo sobre seu próprio filho.
Convido todos os profissionais a perguntarem mais e não se conformarem apenas com o que lhe é contado. Os pais não são obrigados a saber o que é ou não relevante para o profissional saber, mas se você perguntar eles poderão receber mais do seu conhecimento.
Abram-se!
Todas as situações podem ser passíveis de uma orientação, é só querer dar e receber.

2 de junho de 2015

Informação e orientação sobre Processamento Auditivo

Durante 24 horas por dia somos expostos a várias informações auditivas e compete ao nosso sistema auditivo identificar as mensagens que nos interessam, diminuindo ou anulando as interferências que acabam dificultando o entendimento. Ao exercer esta função, o nosso sistema auditivo coloca em uso, o que chamamos de habilidades auditivas.
Existem várias habilidades auditivas e dentre elas, podemos citar: a localização do som, a compreensão da fala no ruído, a compreensão de uma mensagem (mesmo quando ela está distorcida ou fragmentada), a capacidade para eleger estímulos apresentados a uma orelha ignorando informações apresentadas à orelha oposta, o reconhecimento de estímulos diferentes apresentados simultaneamente a ambas as orelhas e a percepção de pequenas e rápidas mudanças nos estímulos sonoros como a freqüência, a intensidade e a duração.
Dessa forma, podemos dizer que além de identificarmos a presença dos sons, também estamos processando cada um deles. Por isso, a avaliação do processamento auditivo é diferente de uma avaliação de audição tradicional (avaliação audiológica). Enquanto uma mede os níveis da audição, a outra avalia a forma como os sons são interpretados  quando ouvimos.
As informações auditivas atingem o sistema nervoso numa sucessão muito rápida. O processamento de cada uma delas deve ser feito em poucos milissegundos, para podermos acompanhar o raciocínio. Assim, se perdermos alguma pista auditiva, por menor que seja, podemos falhar na compreensão da mensagem, como é o caso da falha na interpretação de piadas, duplos sentidos e ambigüidades.
Nos últimos 20 anos, houve um enorme avanço na área das neurociências e isso repercutiu num melhor entendimento sobre o processamento auditivo. Junto a esses conhecimentos que decodificam a informação auditiva, temos outras áreas que estão associadas à leitura, escrita e linguagem, como as áreas fonológica, lexical e semântica,  bem como as áreas que elaboram as respostas. Assim, é preciso pensar no processamento das informações auditivas, sempre que houver uma queixa na aprendizagem.
O encaminhamento para a realização do Exame do Processamento Auditivo deve ser feito para complementar a avaliação clínica fonoaudiológica e nortear a terapêutica.
É de suma importância o acompanhamento da família em casa e em outros ambientes, proporcionando variedade de estímulos e vivências. No campo que concerne à audição podemos orientar algumas atividades lúdicas para as crianças:
  • ·         Proporcione vivencias auditivas ricas com exposição a sons variados (vídeos, instrumentos de bandinha, músicas de ritmos diferentes, sons ambientais e corporais)
  • ·         Peça para a criança prestar atenção nos sons de olhos abertos, vendo as ações que o provocam e depois, para estimular, trabalhe com os mesmos sons, porém  de olhos fechados e pedindo para que a criança os identifique.
  • ·         Associe estes sons com outros parecidos, buscando uma maior expressividade oral e aumento de vocabulário.
  • ·         Nomeie os sons conhecidos e outros não identificados prontamente fazendo uma associação com outros sons parecidos. 


Bibliografia:
RAMOS, B D. But, after all, why is it important to acess the auditory processing? Braz J Otorhinolarygol. 79(5): 529, 2013.

SOUZA, M A et al. Ordenação temporal simples e localização Sonora: associação com fatores ambientais e desenvolvimento de linguagem. Audiol. Commun Res. 20(1):24-31, 2015

20 de maio de 2015

Televisão e linguagem

Desde que voltei a escrever com mais frequência aqui no Blog, tenho voltado minhas postagens para os assuntos mais recorrentes no meu consultório.
Ando surpresa com a quantidade de tempo que as crianças estão passando em frente à TV. Na verdade, nem ficam somente na TV, ficam em frente às telas de um modo geral: DVD portátil, tablet, celular etc.

Entendo que a tecnologia chama atenção, principalmente dos pequenos. Mas por que os pais a oferecem tanto às crianças?
Ganham um momento de calmaria das crianças? É o momento que os pais conseguem resolver as coisas em casa? Por que elas gostam? Por que acham que isso estimula?
Os motivos são inúmeros mas as consequências desse excesso geralmente são as mesmas.

Se pararmos para pensar, o grande foco de atenção na tela é também um isolamento do mundo ao redor. E criança precisa brincar, interagir!

Vamos lá! Tente somar o tempo que seu filho passa em frente às telas... Qual o resultado? 2, 3, 4 horas?
Acredite, eu já atendi crianças que, fazendo o somatório, davam 5 horas! Inacreditável!

Quanto mais nova é a criança, mais prejudicial é esse-tempo-perdido. Qual é a influencia disso no desenvolvimento da linguagem?

As crianças acabam se ocupando de um estímulo passivo por muito tempo e deixam de lado as interações sociais que tanto contribuem para o seu aprendizado.
Elas não conversam enquanto vêem TV, no máximo repetem as falas dos personagens favoritos.
Alguns desenhos fazem quebras dialógicas, que normalmente não ocorrem em conversas naturais com outras pessoas.
Exemplo: O personagem pergunta: - Para onde nós vamos agora?
A criança responde: Para o castelo!
O personagem devolve: - Muito bem, iupi!! Nós vamos ao parque!       (Parque??)

Além disso, ficam de lado a exploração de brinquedos diversificados com a coordenação motora, as corridas com o gasto de energia, o faz de conta com a abstração tão necessária para o desenvolvimento da linguagem, o contexto das relações com as suas expressões faciais, a bagunça com a sua criatividade.  A criança perde mais do que ganha.

Minha sugestão é que não tenha telas para crianças até 2 anos. Esta é uma idade propícia para desenvolver as habilidades de comunicação e interação com as brincadeiras lúdicas. Depois de 2 anos, o tempo de apenas um filme infantil já está de bom tamanho. Ponto!

Também não aconselho que a televisão fique ligada como plano de fundo das brincadeiras. Se começar um desenho que a criança goste, mesmo que ela não esteja olhando, ela vai ouvir e fatalmente vai parar o que estiver fazendo e correr para a frente da TV. Crianças pequenas tendem a prestar atenção nos estímulos mais evidentes, e assim interrompem a atenção no que estão fazendo para dirigir sua atenção para algo mais chamativo. Neste caso, dê preferência ao rádio ligado, somente o som musical, sem as imagens disponíveis.

No início do desenvolvimento a criança precisa de muitas experiências e com a linguagem não é diferente. Colocar a linguagem verbal e não verbal em uso contribui para uma elaboração linguística cada vez mais elaborada. A intenção de se comunicar acaba por promover a qualidade da própria comunicação.

E por último, convido todos os adultos a repensarem o uso da tecnologia em casa. Tenha sim os seus momentos para as redes sociais, conversas online e para as trocas de mensagens... Concordo que no mundo atual isso é necessário. Mas, por outro lado, não exagere. Sente no chão e brinque com as crianças, converse com quem está ao seu lado, ao vivo é sempre muito melhor!

4 de maio de 2015

Atraso na fala ou atraso na comunicação??

Todos se preocupam com a fala da criança! Se a fala atrasa, os pais ficam muito tensos, e neste momento, as brincadeiras ficam como plano de fundo. Com a preocupação pela falta de palavras, os adultos ficam pedindo para a criança repetir uma palavra aqui e outra acolá quase sempre sem sucesso. A ansiedade quer porque quer as palavras e assim,  nem repara na comunicação.
Antes de falar é preciso conhecer muito sobre a comunicação e colocar tal aprendizado em prática. O uso de gestos, por exemplo, fazem parte do desenvolvimento. É claro, que os gestos por si só não devem perdurar por muito tempo, depois de aprendidos eles passam a ser combinados com outros padrões comunicativos como: o olhar e emissões verbais.
Fique atento a alguns comportamentos pré-verbais na criança, que mostram que a comunicação está se desenvolvendo:

  • ·         Sempre atende o chamado do nome.
  • ·         Fica perto de você, mantendo contato visual enquanto vc fala.
  • ·         Compartilha atenção, se mostrando interessado em um mesmo brinquedo.
  • ·         Olha para o que vc mostra.
  • ·         Mostra itens a vc ou outra pessoa, apontando ou oferecendo.
  • ·         Atende seus comandos quando vc os associa a gestos.
  • ·         Usa o apontar para pedir e olha para vc em seguida.


È importante ressaltar alguns gestos que a criança aprende muito cedo, entre 1 ano a 1 ano e meio:
  • ·         Apontar
  • ·         Dar tchau.
  • ·         Mandar beijo
  • ·         Dar beijo.
  • ·         Sinalizar não com a cabeça.
  • ·         Sinalizar sim com a cabeça.
  • ·         Pedir estendendo a mão.


Quando os comportamentos comunicativos pré-verbais estão atrasados, é necessário procurar uma ajuda profissional com um fonoaudiólogo especialista em linguagem.
O Fonoaudiólogo dará as orientações pertinentes a cada caso, encontrando caminhos para a comunicação se desenvolver de forma mais eficiente e/ou iniciará a intervenção terapêutica.
Muitas vezes, os atrasos mais significativos de linguagem começam a se revelar nos comportamentos pré-verbais. E assim, a organização e estruturação lingüística torna-se mais complexa e necessitando de cuidados.

Outro aspecto importante a ser avaliado é o simbolismo ou faz-de-conta como é comumente chamado. Mas esse assunto fica para um próximo post!

5 de abril de 2015

Estimulação da linguagem com brinquedos

Não é raro alguém me perguntar quais são os brinquedos mais apropriados para a idade da criança e quais são os brinquedos que mais estimulam linguagem.
Descobrir quais são brinquedos mais apropriados para idade é moleza. Há inúmeras listas aqui na internet, e ao pesquisar sobre as fases do desenvolvimento você facilmente pode relacionar os brinquedos a elas ao dar uma voltinha na loja de brinquedos.
Agora, responder quais os brinquedos que mais estimulam a linguagem preciso explicar mais um pouquinho.
Então vamos às dicas:
Comece pensando que os brinquedos são ferramentas valiosas, mas apenas ferramentas. O uso que se faz dele é o que realmente é chamado de estímulo. Assim, uma brincadeira que estimula é aquela realizada em conjunto, direcionada e não sozinha.
O adulto precisa ter em mente que ele é fundamental no aprendizado. A interação motiva e faz com que a criança aprenda por observação e por estar sendo constantemente desafiada. Brincar sozinho é bom por um lado, mas por outro é apenas  se entreter,  aprimorar o que já se sabe e fazer pequenas descobertas. Brincar junto é descobrir o mundo!
As vezes o brinquedo é óbvio e não chama tanta atenção da criança. Já o que você propõe nunca cai na mesmice, é muito mais divertido, fantasioso e surpreendente! A criança sabe que menos é mais e que ela terá grandes oportunidades ao estar com vc. Não é raro observar que a criança pode ganhar um brinquedo “show” e no final se divertir mais com a caixa.
Quando a criança brinca a gente já sabe que ela busca fazer relações entre os objetos experimentando novidades. E por isso eu pergunto: Por que o tal cesto de brinquedos que mistura tudo no mesmo lugar???
A criança vai espalhar aquilo tudo... vai mexer em um e outro, vai procurar não-sei-o-quê no meio daquela confusão e no final das contas o controle remoto da TV será mais divertido. É ou não é?
Bom o que fazer então?
A linguagem ela se organiza semanticamente, ou seja, ela faz relações com tudo. Se eu disser  “praia”, vc vai lembrar de muitas coisas relacionadas a isso. Quando alguém diz algo, vc se lembra de outra coisa por fazer uma relação. Ou seja, a gente sempre busca fazer relações, dar sentido ao que está ao nosso redor. As crianças estão aprendendo estas relações, por isso não deixe que os estímulos ao redor estejam bagunçados.
O ideal é separar os brinquedos por categorias. Use as prateleiras, gavetas, caixas, cestos e toda a mobília para ajudar nesta separação.
Por exemplo, numa caixa vc pode colocar toda a categoria que envolve carros: posto de gasolina, pista, cones, automóveis, motos e etc. E, se é uma categoria,  por que não juntar outros meios de transportes como avião e bicicleta, carroça?
Assim quando a criança pegar um brinquedos naquela caixa, há maiores chances de estabelecer relação entre eles. Quando se tem um cesto de brinquedos, nem sempre ela acha aquilo que pode se relacionar. Desta forma, a brincadeira fica mais exploratória, utilizando objetos individualmente sem estabelecer as relações semânticas que tanto auxiliam na linguagem.
Caixa de brinquedos de cozinha, de fazenda, de brinquedos sonoros etc. Dá trabalho no início para o adulto mas aos poucos a criança vai se organizar!
O adulto deve encorajar a criança a brincar com aquela categoria e depois guardar. Ela pode até pegar mais de uma caixa de uma vez, desde que ela mesma separe tudo novamente. Guardar nos locais apropriados ajuda na organização semântica.
Para auxiliar neste processo, você pode colocar fotos, ou figuras representativas de cada categoria na frente das caixas ou gavetas. Isso pode auxiliar as crianças a se guiarem tanto para pedir o que querem quanto para guardar.
Com o passar do tempo você vai ver o quão diversificado vai ficar a brincadeira, o quão organizada e cheia de estímulos ela será.
Até você vai se animar a sentar no chão e brincar junto, pois será muito mais interessante!
Faça a arrumação e depois me conte como foi!